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Meios e Fins versus Fins e Meios

A construção de uma mentalidade estratégica depende mais do que se imagina do domínio de conhecimentos do que poderíamos chamar de escala de prioridade
do processo decisório estratégico
. Mesmo que pareça teórico à primeira vista, é de fundamental importância para qualquer líder dominar a seqüência lógica de decisão optando pelo ordenamento objetivos-estratégias-recursos ou pelo antagônico recursos-estratégias-objetivos. Ou, então, buscando um tertius que mescle ambas as alternativas.

Quando a Promon Engenharia decidiu diversificar para o campo das telecomunicações — hoje um case de enorme sucesso —, sem dúvida alguma teve de optar pelo primeiro procedimento, estabelecendo uma visão mais heterodoxa, traçando estratégias e buscando novos recursos – ou seja, não utilizou tão-somente os próprios recursos existentes – até mesmo no campo do conhecimento e das capacitações, para dar suporte a seus novos caminhos. De outro lado, uma outra empresa visionária, a Gerdau, também um case de enorme sucesso, quando incorporou a Cosigua estava colocando sua decisão na seqüência recursos-estratégias-objetivos, já que dispunha dos recursos para tal empreitada.

Esta discussão, que chegou aos meios acadêmicos e pegou fogo na batalha entre diferentes escolas, é mais importante do que se imagina à primeira vista. Permanecer, de forma maniqueísta, na  decisão sobre recursos pode levar uma empresa a uma postura por demais conservadora.

A Belprato, líder de mercado na década de 80, no Rio de Janeiro, no segmento alimentício – empresa pela qual tenho enorme  carinho até hoje –, pode ter sua falência explicada em grande parte pela mentalidade exclusivamente industrial de sua cultura.

Arraigada aos recursos existentes, a mudança não foi aceita por seus líderes em patamares suficientes para que ela continuasse viva. Por outro lado, abrir os horizontes de forma exagerada, pensando exclusivamente nos objetivos, pode transformar o plano estratégico em uma síndrome de wishful thinking.  Grande parte da dívida acumulada da Varig  – indubitável case de excelência operacional na aviação comercial – é conseqüência a de suas atividades de diversificação,  que chegaram a somar mais de 20 unidades de negócios fora do eixo de sua competência central,  quase todas deficitárias.  A mentalidade do estabelecer objetivos e depois a gente se vira pode ser fatal.

O que fazer, então? No meu ponto de vista, não há dúvida que mais uma vez a virtude fica no meio e a verdadeira equação que leva organizações ao sucesso deve passar por um processo interativo,  retroalimentador e profundamente inteligente que caminhe nas duas direções. Cabe, neste momento, fazer uma ressalva de  grande importância.   O grau de heterodoxia – ou seja, quando se caminha para a seqüência objetivos-estratégias-recursos – deve ser  tão mais forte quanto à  necessidade de a empresa sobreviver com novas atividades.  Voltando a meados da década de 80 e início dos anos 90,  pelo menos dois segmentos econômicos — indústria de informática e empreiteira de obras públicas —, devido ao enorme grau de ameaças que tinham à sua frente, eram obrigados a diversificar para campos onde os recursos não eram o comando de forças dominadas.

Ao contrário,  sua sobrevivência dependeria de um pensamento muito mais arrojado,  onde a visão, a intuição, a abertura mental e até o risco seriam as verdadeiras forças-motrizes do processo.  Passado o tempo,  registro já histórico demonstra que as empresas pertencentes a estes segmentos que estão bem hoje,  devem certamente ao horizonte expandido de sua visão o fato de estarem vivas.

Metodologicamente,  chamamos este conceito de QEV’S — Questões Estratégicas Vitais — e significam  um leque de ações que tem de ser adotado de qualquer forma,   pois são vitais.  Ou seja, se não implementadas,  a empresa aumenta desmensuradamente seu risco de vida.

Este é mais um degrau escorregadio da gestão de empresas. Tanto a megalomania como o conservadorismo são causas do fracasso empresarial.

Por isso mesmo, a administração é uma Ciência, mas também é uma Arte.

Fonte
VIANNA, Marco Aurélio Ferreira. Meios e fins versus fins e meios. Revista Conjuntura Econômica, v. 56, n. 4, abril 2002. Disponível em: <http://www.crasp.com.br/texto_area/meio_e_fins.htm>. Acesso em: 10 abr. 2008.